segunda-feira, 7 de abril de 2008

O Jantar

Domingo, hora do jantar. Neste dia, foi mais tarde do que de costume. Às nove horas. Pensava em almoço, mas os filhos, davam preferência pela parte da noite, foi o que falaram ao telefone com a mãe. Um ia sair com os filhos e a mulher, o outro, ia almoçar com uma colega de trabalho. O namorado ainda não havia telefonado para combinar o jantar. Na semana passada, ao me dar um presentinho, disse que viria, mas telefonaria antes, até agora, nada de telefonema. Márcia inquieta olha para o relógio vê as mesmas horas por seguidas vezes. Parecia que os ponteiros deixaram de funcionar, estavam com defeito, assim pensou, que chegou a trocar as pilhas, por mais novas. Ficou convencida, não adiantou muito, as horas e os minutos, marcavam em seu ritmo, a hora certa. Havia combinado com os filhos este jantar, não tinha nada de especial, em vez de galinha assada, que estava acostumada a comer aos domingos com a familia, desta vez foi feito um peixe assado, era um Dourado, colocado em uma travessa nova que comprou na sexta-feira.
A única que tinha, Ermelinda, havia quebrado no dia anterior. Afoita ao tocar o celular, esbarrou na travessa antiga, que se espatifou ao chão, fazendo barulho e assustando Márcia, que no sofá assisitia ao noticiáro da manhã. Era a segunda faxina que fazia na casa. Da primeira vez, Márcia por ter de sair para levar uma irmã ao médico, deixou a chave com o porteiro João, avisando que a faxineira, chegaria a tal hora e pegaria a chave com ele.
A presença de Márcia na cozinha assustou Ermelinda que falava ao telefone, gélida pela situação desligou às pressas, não sem antes mandar beijinhos. Ciao! Ti voglio tanto bene, sei la mia vita! Baci, amore mio. Ti auguro un giorno felice. Está namorando algum italiano, Ermelinda? perguntou espantada, Márcia, nem sabia que Ermelinda falava italiano e que tinha um namorado estrangeiro. Ermelinda era filha da faxineira de sua mãe que mora na Tijuca. Márcia ouvira falar de Ermelinda, não conhecia pessoalmente, da vez que foi apanhar Dona Maria em casa, em um bairro de Caxias, neste dia chovia muito. Pensou enquanto dirigia que poderia conhecer a filha que Dona Maria falava e elogiava tanto. Mantinha uma curiosidade, gostaria de saber como era a filha de Dona Maria. Ao dobrar à esquerda na esquina do bar, mais cinco casas, à direita, morava Maria, com um neto, filho do primeiro casamento do filho, e a filha Ermelinda.
Dona Maria aguardava a visita na janela. Abriu à porta, recebeu com beijos e abraços a filha de Dona Dulce, sua patroa. Mal chegou disse que ia passar um café e servir, bolo de milho e biscoitinhos de nata, que fazia melhor do que ninguém, deste modo fez as apresentações do que de melhor fazia. Muitos acham que é a faxina, mas não é, disse orgulhosa arrumando os biscoitos. Estes biscoitinhos Dona Márcia, faço apenas aqui em casa, o neto gosta muito. Ermelinda, diz a torto e a direito que adora. Lino, é uma criança dificil de comer, dona Márcia, gosta dos biscoitos e não come a comida, só quer miojo. Lá vou eu pro fogão fazer o tal de miojo, pior que é apenas de um sabor. Come, mas não come tudo, sempre deixa um resto. Tá na escola este ano, olha como está crescido, disse a avó passando a mão na cabeça do neto.Ermelinda, é uma menina estudiosa, precisa ver dona Márcia, mostrando o retrato em uma moldura, nunca repetiu nenhuma série, este ano vai terminar o segundo grau. Uma bela morena comentou Márcia, fixando o olhar na foto, para ganhar de Dona Maria um sorriso encabulado de agradecimento. Ermelinda não estava em casa, tinha ido em Barão de Pilar, na casa de um primo, que passava por uma crise no casamento.
Vamos Maria, estamos atrasadas, preciso chegar antes das dez horas, vamos comendo biscoitos e conversando, foi o que fizeram, para estar dez minutos antes das dez na casa da mãe.
Passado o final do ano, atendendo a um pedido de Dona Maria que estava passando por dificuldades pois o dinheiro da pensão e o da faxina que recebia, não dava para muita coisa, Márcia, arrumou para Ermelinda faxina em sua casa. Dona Maria agradeceu, pois estava preocupada com a filha se conseguiria dinheiro para pagar a conta do celular. Que tanto fala Ermelinda, olho prum lado e pro outro, tá Ermelinda, grudada no celular falando baixinho, com quem, não sei. Não me conta nada, acha que não tenho direito de saber com quem fala ou namora. Ao levar o neto para a escola na parte da tarde, ao voltar, viu que havia correspondência. Pegou o envelope endereçado à Ermelinda, depressa guardou no meio do sutiã, escondido, era a garantia de que a filha não perceberia. Quando fosse tomar banho, abriria e saberia o que tinha de saber. Olhou, olhou, mas não entendeu nada. Vou acordar cedo e vou para casa de dona Márcia, pedir para me explicar,o motivo da conta de Ermelinda está tão alta. Dona Márcia conhece tudo, é uma professora, lê bastante, vai me ajudar. Não entendo, nem tenho celular. Não gosto, não consigo andar e falar ao mesmo tempo, coisa, bem deixa prá lá.
Toca à campainha bem cedo, na segunda-feira, Márcia atende, era Dona Maria, um pouco apreensiva querendo mostrar a conta de celular da filha. Tremia, pediu desculpas para Márcia, que não era certo o que estava fazendo, mas como mãe, preocupada com a filha, trouxe sem ela saber, a conta que mais uma vez, demonstrava um valor alto. Aí, como estou nervosa, dona Márcia, tirando da bolsa um envelope aberto, para entregar. Márcia passou os olhos e viu a repetição por várias vezes de um número de um celular bem conhecido.
Não quero ver, disse Márcia para Maria, que espantada recebeu sem entender. O que foi dona Márcia? A senhora está pálida. Nada Maria, quer dizer, achei o número de telefone de Hamilton. Tenho certeza que é o dele. Não pode ser dona Márcia, a minha menina nem conhece o seu Hamilton. Nem ele conhece Ermelinda. A senhora viu errado. Era o italiano, bem que naquele dia, ficou sem graça, com a cara assustada. Que intimidade! Dona Maria vou dispensar Ermelinda da faxina, ter uma conversa séria com os dois.
Os filhos estavam atrasados, não telefonaram, o telefone de Hamilton, estava fora de área, Insisti mais duas vezes e nada. A janta, o peixe tinha sido jogado no lixo, os filhos não apareceram, o namorado, nem telefonou. Ermelinda, queria conhecer a casa do namorado, o mesmo namorado de dona Márcia. Sabia quem era ele, descobriu. Queria ver a reação dele ao ver ali, na casa, fazendo faxina, ao lado da antiga namorada, mas não foi possível das duas vezes em que foi fazer faxina, Hamilton, não havia chegado. Um dia Márcia soube por alguém, que Hamilton e Ermelinda estavam morando juntos, em um pequeno apartamento na rua do Catete, Ela era bem mais jovem do que ele, empolgado, muito empolgado começou a ficar com uma mulher mais jovem, uma bela morena.

Eleuterio Sanches - Eleuterio Rodrigues de Sá e Sanches. Pintor, nascido em Luanda (Angola), mantém uma interessante página na internet.

















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